Cultura

“Labirynth”: um convite ao Corpo

De 12 a 18 de maio, o coletivo Sobjetivo apresentou a sua mais recente exposição, "Labyrinth ". Esta exposição de multimédia contou com trabalhos fotográficos de Inês Vieira e Diogo Oliveira, bem como uma performance por Nuno Fareleira. Por Margarida Leite Gonçalves.
‘Labirynth’. Fotografia por David Pessegueiro (2023)

Labirynth decorreu na cave do Café au Lait, nas Galerias de Paris. Neste espaço escuro, a que chegamos depois de descermos umas escadas íngremes, é-nos apresentado algo que vai para além de uma simples exposição de fotografia. Uma instalação artística que se assemelha a um labirinto, onde o Corpo e o Ser são convidados a se perderem.

A exposição integra composições com elementos variados, desde lã, lençóis, arames e plásticos, tudo combinado numa harmonia peculiar com as obras fotográficas. Segundo Diogo Oliveira, um dos autores da exposição, todos os materiais utilizados “vieram da raiz”, “do campo e de casa da Inês e nós conferimos-lhes outro propósito”.

Inês Vieira expõe uma série fotográfica designada “Cuarto”, em que explora o nu feminino. Inspirando-se em nomes como Marina Abramovich, Yoko Ono, Ana Mendieta e Carolee Schneemann, a artista estuda o corpo feminino pretendendo superar a sexualização a ele associada.

Em Labirynth, Diogo Oliveira apresenta uma série de autorretratos também focados no corpo humano. Nesta série é explorado o conflito entre o corpo e o animal, a dualidade entre o lado Humano e o Ser, a constante luta que habita no cerne de todos nós.

Todas as obras expostas por Diogo são registos de momentos performativos em que o artista explora os limites do corpo e o apresenta ao espetador de forma provocatória, procurando exibir o imenso poder de um corpo maleável, e com fronteiras moldáveis.

A acompanhar a exposição estava a performance de Nuno Fareleira, que, utilizando plásticos a envolver o corpo e a cara, se movimentava de forma quase animalesca. Servindo-se de um instrumento de ferro durante a performance, o artista produzia sons metálicos acutilantes, que se assemelhavam ao som de correntes a serem arrastadas pelo chão. No final da sua atuação, Nuno acaba sentado de pernas cruzadas, e vindo do público ouve-se um sussurro:

“Parece que acabou de nascer”

A exposição contou também com a participação das artistas Rita Galanó e Angela Ugarte, enquanto curadoras e integrantes do coletivo Sobjetivo.

‘Labirynth’. Fotografia por David Pessegueiro (2023)

 

“Cuarto”: “o poder do nu feminino” na obra de Inês Vieira

Inês Vieira, nascida em Barcelona, reside atualmente no Porto. Em conversa com o JUP, no final da exposição, a artista referiu que o seu percurso escolar teve bastante influência na sua obra. “Frequentei um colégio americano até aos 15 anos, só depois é que ingressei na escola pública. Esta mudança fez-me sair da ‘bolha’ onde me encontrava e foi a partir daí que me tornei mais política e desenvolvi consciência social.”

Destaca também o papel de uma docente da FBAUP, Rita Castro Neves, que lhe permitiu expandir as suas conceções da arte “para algo mais moldável e livre”, do que Inês julgava ser.

A artista salientou ainda que as temáticas relacionadas com o género e a sexualidade têm sido o objeto das suas obras há bastante tempo, “e do meu pensamento ainda há mais”, aponta.

  “Sinto uma necessidade pessoal e política de entender os mecanismos com os quais funciono, e entender quais os que me pertencem a mim e quais são do mundo exterior e não meus. O que eu sinto realmente meu, e o que eu sinto por imposição.”

No que concerne ao corpo feminino, objeto central das suas obras, a artista destaca que “ver o nu feminino em contextos que não sexuais é extremamente poderoso”, sublinhando que sempre sentiu conforto no seu próprio corpo, mas que “elementos externos” a si lhe impuseram noções de “vergonha” e “culpa” que agora tenta desconstruir no seu trabalho. Inês frisou ainda o papel dos outros artistas que participaram na elaboração da exposição, “há uma união no nosso trabalho. Lidamos com a liberdade, com a autonomia e com a delicadeza que é o Ser e o existir num mundo que espera tanto de nós”.

‘Labirynth’. Fotografia por David Pessegueiro (2023)

“Olhar corpo a corpo” com a série de autorretratos de Diogo Oliveira

Diogo Oliveira vem de São João da Madeira e mudou-se para o Porto no último ano. Confessa-nos que vir para o Porto foi imperativo para poder “ganhar liberdade” e “desenvolver o seu potencial artístico”.

O fotógrafo não tem uma formação superior no campo das artes, tendo, contudo, formação em dança contemporânea, algo que considera influenciar muito os seus trabalhos. “Sinto a necessidade de expressar o corpo a voltar a mim de outra forma”

Com as suas obras, cujas grandes referências são os artistas Francis Bacon e Antoine D’Agata, o artista procura “criar uma constante provocação”, através da exposição do corpo de forma “animalesca”. Realça que o ser humano sente necessidade de se “ver no outro” para poder estabelecer empatia. Nesta série fotográfica, Diogo apresenta um corpo, mas “não da forma que querem”.

Para o artista, explorar as várias facetas do corpo materializa-se não num projeto, mas “numa necessidade”, longe de terminada. Por fim, o fotógrafo confessa que ainda quer “aprofundar ainda mais o trabalho fotográfico e enveredar também pela área da performance”.

‘Labirynth’. Fotografia por David Pessegueiro